UNIVERSIDADE DE ÉVORA Formação diminui, mas propinas sobem
19-Out-2006
A primeira impressão é de desorientação. Ninguém está bem informado, ninguém tem certezas nas decisões que tem de tomar, seja na inscrição de disciplinas ou na opção pelo currículo antigo ou pelo novo. Depois, quando se percebe o desaparecimento de cadeiras fundamentais e a deficiência de formação, surge o descontentamento. As dúvidas em relação ao futuro mantêm-se, mas a revolta vai crescendo, num sentimento de injustiça contra o aumento das propinas e a quase obrigação de fazer um mestrado para ficar com a mesma formação da antiga licenciatura. «Não tenho direito aos cinco anos com que estava a contar quando entrei e ainda vou ter de pagar uma quantia exorbitante para fazer o segundo ciclo e ficar com a formação que deveria ter», refere Tiago Ferreira, aluno do 3.º ano de Engenharia Informática e membro do Senado da Universidade de Évora, que, no próximo ano, verá a sua licenciatura passar para três anos. «É irreal dizer-se que uma pessoa é licenciada em Engenharia Informática, quando em três anos temos apenas uma competência básica em engenharias. Nos três primeiros anos as cadeiras são têm um carácter geral: análise matemática, física, álgebra... Em termos de conhecimento técnico e aplicado ao mercado de trabalho, isso não chega», explicita. «Duvido que tenhamos competências para a nossa vida profissional. Com cinco anos teríamos, com três não», defende. Tiago Ferreira faz planos para arranjar um emprego quando terminar a licenciatura para juntar dinheiro, tirar o mestrado «e ficar com uma boa formação». Não há informação oficial, mas pelos corredores da Universidade de Évora diz-se que o mestrado deverá custar 2500 euros. «É muito dinheiro. Se já agora há muitos estudantes a abandonar o sistema de ensino por causa das propinas e todas as outras despesas, ainda mais complicado será com esses valores», comenta. «Vou trabalhar em qualquer coisa, dificilmente na minha área. Há tanta gente com a formação de cinco anos, por isso não me vão contratar a mim, com uma formação de três anos», prevê.

Aulas práticas retiradas

João Fernandes entrou no ano passado em Sociologia. Agora, no segundo ano, vê a estrutura do seu curso completamente alterada. As modificações começam pelo tempo de frequência, encurtado um ano. «A Associação Portuguesa de Sociologia considera que uma formação de quatro anos é suficiente para formar um sociólogo. Três anos não chegam, ficamos apenas com um domínio básico da sociologia e seremos técnicos de recolha de dados. Até no mercado de trabalho, quem tem uma formação de quatro anos terá mais hipóteses. Entrámos numa licenciatura para nos formarmos como sociólogos e obrigam-nos a sair como técnicos», argumenta. De acordo com os novos programas, para se ser sociólogo é preciso fazer mestrado. A licenciatura tem 400 pessoas, mas nem todas podem fazer o mestrado, mesmo que queiram e tenham dinheiro. Para além das propinas serem de 3 mil euros, o número de vagas é limitado e é preciso ter média de 14 valores e passar por um júri. Um dos argumentos apresentados para introduzir o Processo de Bolonha na Universidade de Évora foi tornar os cursos mais práticos. Mas agora verifica-se que era completamente falacioso, pois desapareceu o trabalho final de curso, em que se fazia investigação e trabalho de campo, e os estágios, onde se trabalhava directamente na área da sociologia. «A componente mais prática são os seminários, onde se ensina coisas tão básicas como enviar e-mails e usar programas de processamento de texto. É ridículo! Além disso, estes seminários não equivalem em nada ao trabalho final ou aos estágios», considera João Fernandes. Quem está a acabar a licenciatura com o antigo currículo tem de fazer este ano cerca de 15 cadeiras. Quem opta pelo currículo de Bolonha é obrigado a pagar mais um ano de propinas (cerca de 800 euros) para fazer três ou quatro disciplinas que não existiam, apesar de não terem nenhuma em atraso. As equivalências constituem outro problema. «São dadas equivalências a disciplinas novas que não têm nada a ver com as cadeiras antigas. Pessoas que tiraram Psicologia Social tiveram equivalência a Psicosociologia. A muita gente isto pode parecer igual, mas são duas coisas muito diferentes. Estas equivalências estão bem em relação aos créditos, mas não em relação à nossa formação», sublinha o dirigente da JCP. Também as licenciaturas de Turismo, Economia e Gestão foram reestruturadas este ano lectivo, passando de quatro para três anos. Os estudantes desta última têm de tirar dois anos de mestrado para serem reconhecidos como gestores. A propina do segundo ciclo será de 3 mil euros. No caso de Economia, os estudantes serão obrigados a tirar pelo menos um ano de mestrado para serem reconhecidos pela Ordem dos Economistas, um ano suplementar para poder exercer a profissão de economista. Se fizerem apenas a licenciatura, serão técnicos.

in Avante! nº 1716, 19 de Outubro.2006

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